sexta-feira, 24 de dezembro de 2010
Ainda Aberta
quinta-feira, 16 de dezembro de 2010
No meu armário

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010
Nu inteIrior
É me carregando e me empurrando às vezes...
Tenho me pesado ultimamente. Não as gorduras, mas as bagunças internas que tenho para arrumar. Faz muito tempo que não mexo nelas, o excesso de coisas externas me ausentaram desse quarto de existência, aliás já deve beirar um sexto, sétimo. Não que eu tenha deixado de visitá-lo, eu até chegava a adentrá-lo, mas no cansaço jogava tudo para o lado e me aconchegava no descanso da beirada.
Esses dias, porém, me deram um ultimato: ou aparecia ou a leveza e o amadurecimento iriam embora. Sem saída, parei na frente do monte que me impedia de continuar sem pesos e aos poucos avancei. Abri caixas e enxerguei falhas passadas em cima de antigos palavrões. Portas quase abertas, esforços incompletos, limites não ultrapassados, quases. Abri as pastas e derrubei todo material no chão. Incertezas, dúvidas, dívidas, medos caíram aos meus pés.
Encontrei palavras desfeitas, contratos, desculpas. Olhei cada detalhe de tudo que pudia, frente e verso, cima, baixo. Achei alguns problemas resolvidos, mas remoídos na falta de outros assuntos. Enchi as mãos e rasguei todos. Os picados sumiram, deixando um gosto de riso e um degrau. O amadurecimento prometido acontecia. Continuei na ordem da desordem cada vez mais leve.
De repetente tropecei em uma vitória intacta. Soprei o pó que a cobria e lembrei do dia que a conquistei. Sempre a quis, mas não comemorei porque estava ocupada demais pensando nas coisas que o meu empenho máximo não tinha conseguido fazer. Dessa vez a abracei, pulei com ela e ri alto. Dancei sozinha. Ou melhor, com ela. Na coreografia inventada, gritamos alegrias, mandando embora todos os dedos apontados, constrangidos eles foram e não voltaram mais.
As latas de lixo já estavam cheias e a desordem bem menor, quando me deparei com sacos pretos. Avancei sobre eles e vi que estavam tomados por coisas que fizeram meu coração doer. Por impulso, arranquei tudo lá de dentro e com raiva pisoteei, não quebrou. Trouxe para perto do peito e tentei partir em vários pedaços, mas quanto mais colocava força, mais resistente e áspero ficava. Minhas mãos doíam e o sangue pulsava. Aquilo tudo não me permitia descarte. Nem sinal de gosto de riso e nem degrau.
Lágrimas rolaram. Sentei cansada, fechei os olhos, respirei fundo. No silêncio profundo os degraus me convidaran, obedeci. De cima percebi que os sacos eram menores que pareciam e o inquebrável não passava de proteção. Era preciso valer a pena ter sentido a dor, se a eliminasse antes do fim, se estilhaçaria e ficaria incolável, ganharia, então, o nome de fracasso . Não podia interromper o curso dos desesperos, das lacunas e dos excessos somados, eles eram necessários, precisavam ser vividos intensamente até perderem a cor.
Então o descarte chegaria junto com o gosto de riso e o novo degrau no momento certo. Com eles eu alargaria os lábios e cresceria mais um pouco, as coisas mudariam de tamanho, de temor, amadureceria. Enquanto isso não acontecia, era preciso respeito ao curso da vida.
É me entendendo e amando outras... Por Natália Oliveira
sábado, 27 de novembro de 2010
Venha
Venha, apesar da névoa instalada nesse dia de sol. Sente-se e conte-me coisas boas. Algo que tenha lhe feito feliz hoje, ontem ou semana passada. Qualquer coisa que puxou seu sorriso de um lado a outro e deixou o mundo mais colorido. Fale, eu ouvirei. Esqueça do sério demais, do formal. Ria, eu vou com você, afastando toda gente que diz que rir alto é “feio demais”. Não se acanhe! Não há nada de brilho aqui, além do sol. Venha assim mesmo. Não levo nada além do pano leve do vestido. Vestida de mim da cabeça aos pés. Chegue e sinta o seu ser também, ele pede para tirar o aperto. O nosso estreito. Sente-se. Fique.
Por Natália Oliveira
domingo, 21 de novembro de 2010
Um Batom
Ao senhor. Por Natália Oliveira
quarta-feira, 17 de novembro de 2010
Sem Saber
Entrou pelas janelas da cozinha, provavelmente vindo de outra, e seguiu ao meu encontro no escritório. Encontrou-me despenteada, de pijama e pantufa, digitando comentários em blogs. Tocava “Canção Para Você Viver Mais”, do Pato Fu. Na tela do computador, uma janelinha do msn piscava. Era um amigo. Visivelmente um amigo. Tudo muito claro para mim, mas não para quem chegasse. E ele chegou. E chegou sem avisar, escondido. Entrou, se aproximou e simplesmente me invadiu, sem pedir autorização ou licença. Veio com tudo. No impacto perdi a consciência do que fazia, larguei o teclado, soltei a ideia do pensamento e em voz alta me perguntei: “de onde vem esse cheiro de bife acebolado?”. Era tão vivo que pude imaginar o gosto da carne. Ele me entorpecia e agitava minha cabeça, me convidava para sentar à mesa. Se fosse, o que encontraria? Toalha, panelas e litros de refrigerante? Ou alguns pratos rasos já cheios pela comida servida na cozinha? Orariam antes de comer? Ou não? Quantas pessoas estariam? Cinco, seis, sete? Ou menos? Ou mais? Do que conversariam? Não sei. Ele foi embora e eu fiquei sem saber. Não sei.
Por Natália Oliveira
segunda-feira, 15 de novembro de 2010
Por Natália Oliveira
sexta-feira, 12 de novembro de 2010
Quando Matei Aula
para...despertei. Precisava me esconder, antes que alguém me encontrasse!!!
Corri até o banheiro próximo. Entrei rápido, me enfiei em uma das cabines, tranquei a porta, fiquei em pé no vaso e, logo em seguida, me encolhi inteira. Minhas costas encharcavam a camiseta. Cabulava. No auge dos meus 10 anos, eu finalmente cabulava. Era simplesmente genial, tinha escapado de todo mundo e agora cabulava! Independência ou morte! Revolução! Eu era muito evoluída, pensava. Cinco minutos depois na mesma posição, deixei o banheiro com câimbras, lamentei a ideia e pedi para entrar na aula.
Por Natália Oliveira
domingo, 31 de outubro de 2010
Até firmar os passos
Vai ser assim até firmar os passos de novo. Acostumada com o solo seguro, é difícil imaginar como será o imprevisível. O que se sabe é que o caminho já não é o mesmo, os passos não ficarão marcados como antes e isso a faz pensar que não é capaz de andar. Sente um arrepio na espinha, trava o mapa, gruda os pés na linha de partida. Um novo chão a espera, longo, vivo, uniforme. Ela o recusa. Chuta. Suja os sapatos. A terra levanta grãos em forma de poeira e depois assenta no mesmo lugar. Pensa, então, voltar para o caminho já percorrido, onde o andar lhe é familiar, mas ao mesmo tempo, sabe que não é feita de retrocessos. No fundo, gosta do embate, porque são eles que a tiram dela mesma. Cospe o pensamento, nega-se. Observa os canteiros, olha bem os refúgios e alimenta a certeza de que se não der, pode correr escondida, camuflada para o topo de alguma árvore. Mas mesmo vendo que os galhos a suportariam, sabe que não é na fuga do embate que elimina os medos. É vivendo-os. Briga consigo por pensar tantas contradições, manda e obedece o pedido de calar a boca. E cala. Cala os pensamentos, mas o corpo continua a gritar. Suas pernas tremem, o coração empurra o peito pra frente e para trás, gotas de suor escorrem da testa e molham a camiseta. Sente a saliva sumir da boca. Náuseas lhe jogam o estomago para um lado e para o outro, a cabeça parece girar. Tentando equilíbrio lança um olhar aos canteiros, vê bem os refúgios, sabe que pode fugir. Mas não foge. Corre! Corre pelo chão incerto, tropeça, afunda os pés no desconhecido, corta os dedos com pequenas pedras que saltam em seu tênis, mas continua a correr. Até que sua força se esvai, permite-se cair então. Seu corpo toca o chão áspero, tudo lhe dói. Ajeita-se no desconforto como pode, traz as pernas ao encontro dos seios e chora. Lágrimas grossas vão ao encontro de seus lábios, que ficam salgados. As dores lhe parecem as mais agudas que já sentiu. Com ajuda dos braços arruma as pernas e levanta-se, como bonecos de elástico. Finca os pés no chão. Sente medo, muito medo, mas já sabe que não é a mesma. Leva as mãos ao rosto para conter o suor que lhe molha. As árvores já não lhe parecem tão seguras. Equilibra-se, pega suas forças pelos fios, sustenta a vontade nos olhos e corre certa de que se machucará de novo, mas já não é mais a mesma. Por Natália Oliveira
sábado, 9 de outubro de 2010
A arte de cobrir os pés
quinta-feira, 2 de setembro de 2010
Férias
Vital
Por mais convicta e ideológica que eu seja, é vital para minha existência um espaço para a dúvida. Preciso – e precisar é além de desejar – deixar um “ou não” caminhar bem do ladinho da certeza absoluta. Dou o meu melhor no que me proponho, mas não me iludo, eu posso renunciar ao meu melhor sonho a qualquer momento por puro prazer de escolher de novo.
Sou capaz de fazer escolhas e defendê-las até a esquina da mudança de ideia, de plano. Por mais decidida e consciente das minhas decisões, não deixo o alimento do meu lado incerto faltar. Ele me ajuda a saber que os ultimatos são perigosos e que devo manter a distância necessária para não me envenenar. Vida é movimento, dizem por ai, e é nele que eu me esbaldo.
Não sufoco as ideias dos meus milhares jeitos e nem repreendo suas vozes, suas existências são tão necessárias quanto o ar. Eles tão vivos em um dos meus lados insistem em abrir a porta do caminho ainda não explorado. Nem sempre sigo suas trilhas, mas a calma inunda só de saber que a qualquer momento posso voltar. E eu volto porque não sou uma, sou muitas e todas querem me trilhar. Não levo jeito para viver amarguras só por medo de olhar para atrás. Eu vou e volto, subo e desço, giro, me transformo, me encaixo e entro para sair e saio para entrar. Tudo para ver de qual maneira é a minha, é a melhor, é a que vai me agradar. É vital.
Por Natália Oliveira
quinta-feira, 26 de agosto de 2010
Não é felicidade
Por Natália Oliveira
sexta-feira, 20 de agosto de 2010
...
sexta-feira, 13 de agosto de 2010
Recém
sábado, 7 de agosto de 2010
Dona Josefa
Por Natália Oliveira
quarta-feira, 4 de agosto de 2010
Tempos Fugit
...Por isto, tire o tempo para ouvir suas músicas prediletas, ler seus autores preferidos, estar rodeado das pessoas que você realmente ama. Não temos tempo para tudo, para viver bem é preciso escolher o essencial.
Ps> Arrumando minhas coisas encontrei um cartão de aniversário, reli e gostei especialmente deste trecho que divido acima com vocês.
Por Natália Oliveira
segunda-feira, 26 de julho de 2010
Reconhecer
terça-feira, 20 de julho de 2010
Dia do Amigo
Aos meus amigos agradeço o ano inteiro, despretensiosamente em horários diferentes, em dias sem data. Eles sabem do meu amor infinito, tanto que faço questão de declará-lo sempre, mas hoje... Hoje... No dia de hoje, as minhas palavras são daqueles que me deram todas as letras num dia só. Pessoas que passaram pela minha vida e cuidaram da minha alma, acalmaram o meu desgosto, seguraram as minhas lágrimas. Algumas cuidaram da minha fome, outras da minha falta de dinheiro e há quem pintou o colorido no escuro da minha casca. Outras enalteceram o meu nome e sorriram um sorriso impagável quando deixei moedas. Pessoas que me ensinaram geografia sem mapas, pedidos de beijo sem fala, dignidade no corpo vendido. Gente que me chamou de anjo. Gente com G e coração maiúsculos.
Bondosos por despertarem os mais belos sentimentos e audaciosos por me apresentarem os medos escondidos, gentis por me ajudarem tratá-los. Dividiram-me histórias, me convidaram para um mundo doloroso, mas seguraram os espinhos com as mãos para que nenhum deles me machucasse. Tomaram chuva por mim, me privaram do perigo. E no perdido me disseram que São Paulo não é para ser conhecido, mas do mesmo jeito deram um jeito de me achar. Até me pediram em casamento, acarinharam a minha rosa, me apresentaram colar de bolas com gosto de infância. Me protegeram em baixo de asas feitas de uma fragilidade forte.
Aos que me apresentaram a amizade num dia e me deram certezas de toda uma vida, ainda há gente de verso bonito. O Dia do Amigo sempre foi de vocês. PS: Às senhoras da minha humanidade: Creusa, Diná, Natália, Velinha do óculos, Moça que vende o corpo, Fernanda, França, candidata à mãe, dona do colar de bolas. Aos senhores do meu sorriso: Felipe, moço da carroça, dono das muletas, parceiro da loucura, guardião da paz, menino do paraíso, Enoque, seu Vicente, senhor da salada, Antônio. Por Natália Oliveira
sexta-feira, 16 de julho de 2010
À Dona dos Cachos Dourados
Na verdade, fácil de entender você nem sempre é. Ora ri com o estômago, ora chora com as tripas de fora. Intensa como a vida deve ser? Não sei, mas ser com você, já que é para ser, que seja direito! Você é!De pijama e tudo, no mar. De pés sem sapatos, de molequice em baixo do braço, de lordose e unhas roídas, mas de verdade! Com verdade transparente! Quem vê você, vê você. Frente e verso, fora e dentro dá no mesmo. E por falar nisto, injustiças fora, transformações dentro, assim é você.
Você de cabelos de criança, de olhos vivos e de um desejo meu. Se eu fosse mago a transformaria num cristal para apresentar para todo mundo um pedaço meu, o pedaço cristalino meu. Você não me explica, mas eu sei que é a sua doce essência que dilata os seus olhos quando olha o jeito meu. Você, minha amiga, minha parte, minha criança bonita. À minha Flávia, a menina de cachos dourados, a minha.

quarta-feira, 14 de julho de 2010
Veludo
Se poderei voltar a sonhar, deixo a resposta ao futuro. Estou feliz por ter conhecido pessoas como a Vã, a Michele e agora você. É uma realidade surpreendente a essa altura da vida. Ou um milagre, como você prefere. Não há mais amargura em mim.
Numa destas trombadas de calçadas apertadas seu coração derrubou tudo que guardava. De precioso, recolhi os sentimentos numa caixa de madeira, encapada a veludo. Lá dentro misturou tudo, o mais bonito com o mais vivido, no final das contas era um infinito só!Por Alvaro Vianna e Natália Oliveira
terça-feira, 13 de julho de 2010
Menino do sorriso, do paraíso
Em todos os canais. Todos. O mesmo caso, a mesma morte, o mesmo desespero estampado na tela. Eu já derrubei no teclado a minha angústia algumas vezes aqui. Já declarei minha previsão: a humanidade ainda se afoga em água salgada. É muita lágrima, diariamente e de enxurrada. E o nosso medo aos poucos ganha nome: Bruno, Mizael, Nardoni, Suzane, Lindemberg, entre tantos outros, que os novos casos nos ajudarão esquecer. Na fila do supermercado, na sala da casa, nas mesas de cerveja e nos cantos da cidade o assunto chega e fica por tempo indeterminado. A dor enraizada petrifica as palavras, arranca do povo até a fé. A fé na alegria teimosamente perseguida e quem sabe conquistada. Na tristeza a descrença chega forte, rasteira já para derrubar. Salve-se quem puder! Sexta-feira à noite é banquete para mágoa presente, porque é a hora que o ciclo fecha. O momento em que a cabeça tá livre dos deveres, mas a procura de se ocupar. Os pensamentos se apresentam, a realidade vem logo atrás, embutida em cada reflexão. Pontadas, levemente pontadas, mostram a conexão brilhante e dolorida entre alma e coração, cérebro e tudo isto. Inevitável. Pensava em tudo isto, enquanto falava sobre outras coisas. Esperávamos pelo garçom, ele traria nosso refúgio em bandeja. Tínhamos escolhido uma mesa com quatro cadeiras, perto do parquinho infantil do restaurante. Algo no canto, diferente do que tinham nos sugerido. No salão vários pratos desfilavam por cima de nossas cabeças, a gente esperava. Tamborilando a impaciência nos dedos, te encontrei. Um vidro nos separava. Você no colorido, eu na escuridão da minha casca. Comia pastel com papel e tudo. Em silêncio lhe perguntei: “às vezes viver neste mundo de grande é como comer folha amassada, duro de engolir, arranca água, sabe?” Você nem notava. Em algum momento me olhou e sorriu desconfiado, encostado em quem te protegia. Era pequeno de corpo moreno, não tinha mais que três anos. Com vergonha, eu pedia para entrar no seu mundo, mas senti minha passagem censurada. Talvez fosse pequena demais. Então você deitou o rosto no ar e o teu sorriso chamou a minha calma, acalmou a minha alma. E a nossa esperança aos poucos ganha nome: menino do sorriso, do paraíso, ainda há. Eu tenho sido mal representado por aqueles que não Me conhecem, mas não Estou ausente ou zangado (I Jo 4:16)pois sou a expressão completa do amor. Se deleite em Mim e Eu darei a você os desejos do seu coração (Sl 37:4)pois fui Eu quem colocou esses desejos em vocês (Fp 2:13) Por Natália Oliveira
sábado, 10 de julho de 2010
A Carta
Fui ao centro de São Paulo a procura de um documento. Minha missão era clara: descer no ponto certo, achar o prédio do Sindicato e voltar para casa com a carta, sem me perder. Era tarde de outono, sexta-feira, o tempo estava fresco e o céu azul. Sai do escuro do metrô e o sol me recebeu. Encontrei a rua do mesmo jeito que estava, meses atrás, na última visita. A barraquinha de filmes no mesmo lugar, a banca de jornais na calçada e as cadeiras de plástico no bar ao lado. Tudo nos conformes.
Andei em direção a praça próxima enquanto me perguntava “reto ou esquina?”. As pessoas passavam apressadas, o vendedor de comida ensinava roteiro e uma música alta rolava. E eu tentava de todas as formas acionar a memória. Sai sem endereço. Sem nome de rua. Não dava nem para perguntar. Tinha horário, arrisquei alguns passos. Parei diante da construção amarela da igreja, “contorno ela ou não?”. A música, antes fundida com outros barulhos, se mostrava mais clara, agora. Sons de instrumentos um sobrepondo o outro, nada convencional. Diferente. De onde vinha?
Mexi o corpo a procura. Meus olhos encontraram um tapete marrom claro, feito de couro, estendido no chão, ali perto. Uma mulher de cabelos longos e pretos repousava as pernas cruzadas ao lado de um radinho a pilha. Os fios trançados ostentavam penas coloridas. Ao seu lado, um homem de pele dourada balançava pernas e braços, o vento batia no cocar enquanto ele dançava. Dançava sem parar. Quando a música já estava no fim, sem cessar os movimentos ele pedia à índia, ela voltada. Ninguém assistia ao espetáculo.
A tarde já tinha caído quando sai do prédio com o envelope. Talvez tenha sido isto, o azul marinho do céu me confundiu. Atravessei as avenidas paralelas embaixo do viaduto e continuei em busca do metrô. Demorei um pouco para perceber que estava perdida e mais ainda para encontrar alguém que soubesse me dizer por onde deveria ir.
Caminhei tudo de novo, sentido contrário. Não tinha quase ninguém mais na rua, os comércios estavam com as portas semi-abertas ou já fechadas. Na calçada torcia pelo vermelho do semáforo, quando o vi chegar. Vinha com os carros, mas vinha devagar, sem pressa. Olhei para o seu rosto de anos a mais e ouvi o seu convite. “Vamos casar?”. Não respondi nada ao cavalheiro, silenciosa segui, ele fez o mesmo. Cavalheiro sem cavalo, mas com uma carroça e bastante coisa dentro, até.
Depois de tanto, consegui chegar ao metrô. Entrei e sai depois de uma hora. O cenário era o mesmo, barraquinha, banca, cadeiras de plástico. Horário de pico, impossível entrar nos vagões. Esperei o quanto pude, mas não deu mais. O limite foi uma discussão entre dois senhores, brigavam porque um acusava o outro de empurrar. A verdade é que era cotovelo e atropelo para todos os lados, impossível achar o responsável. Vou de ônibus.
Insisti bastante até encontrar alguém que soubesse. Ela. Desviava de pessoas sentadas em volta de mesas regadas a cerveja e segurava a bolsa com força. Parou desconfiada quando a abordei. Expliquei que eu devia procurar por um ponto ao lado de um Bradesco, mas não sabia como chegar lá. Em resposta, ela me olhou nos olhos e me explicou pausadamente para que eu entendesse. Agradeci e então ela se aproximou um pouco mais e me suplicou cuidado, “lá é perigoso, tá?”. Algo de maternal transbordava naquele pedido.
Cheguei ao ponto e recorri ao homem de camisa pólo e ar descansado. Contei minha aventura no centro, “me perdi pelas ruas, meus planos de voltar para casa de metrô não deram certo e agora preciso de um ônibus, que eu não sei qual é”. Por sorte ele sabia. Agradeci. Permanecemos em silêncio até que ele pediu para que eu não ficasse chateada por me perder em São Paulo, afinal de contas “quem não é daqui, estranha mesmo, é normal”. Não sei se minha expressão denunciava algo não sentido, mas ele pareceu se preocupar. Logo o letreiro luminoso deu vida ao meu destino, dei sinal e antes de subir ele me lembrou o caminho. “Não esquece”.
Minha missão era clara: descer no ponto certo, achar o prédio do Sindicato e voltar para casa com a carta, sem me perder. De tudo, passei pela selva, abandonei meu noivo, conheci candidatos a mãe e irmão e ainda voltei com a carta.
Por Natália Oliveira
sexta-feira, 9 de julho de 2010
A Paz da Minha Paz
Eu corro, mas a paz me chama. Invade-me aos poucos e convida-me de um jeito irresistível a ficar junto. Eu tento um argumento, mas ela é teimosa, não aceita, não arreda pé. Amiga íntima da vida que passa e que sabe o que há de melhor, me convence. Eu entrego a minha alma, então. Ela fica satisfeita e me alegra de um jeito doce. O suspiro carrega o vento, a tarde cai ao nosso alcance.
Por Natália Oliveirasegunda-feira, 5 de julho de 2010
Ou não
Foi uma coincidência incrível. Minha mãe me pegou pelo braço e disse “Naty, veja se consegue baixar Mãos Talentosas, o pastor Ricardo disse que é ótimo”. Era domingo, na igreja, ela falava aos cochichos. No dia seguinte uma amiga, o pequeno Sol já mencionado aqui, me mandou e-mail sobre a mesma coisa: “precisamos combinar de ver Mãos Talentosas, é lindo, lembrei de você”. Hoje vejo pela segunda vez a história de Benjamin Carson.
Não sei fazer críticas de filme, mas está tudo tão aos montes aqui dentro que as impressões estão pulando no teclado. Carson nasceu em lar pobre, filho de pai ausente e mãe analfabeta. Na escola somava notas ruins e sofria constantes gozações de outros alunos, algumas vezes resolvidas com agressões. Discriminado por ser negro, não via potencial em nada que fazia.
O que de bom poderia vir de Carson? Ter nascido em solo estrangeiro não impede de enxergarmos o destino. Temos exemplos todos os dias, nos faróis, nas calçadas, nos noticiários. Quando viram documentários, o acesso de compaixão vem certeiro. O que esperar de alguém que sofreu tanto? Revolta, claro. Uma mínima reação a tudo de ruim que aconteceu. Ou não. O ou não é fascinante.
O ou não une dois extremos: a dúvida e a certeza. A dúvida dos ultimatos e a certeza de que se pode ir bem mais além do estipulado, é só trabalhar duro e não conhecer o limite.
Por Natália Oliveira
domingo, 4 de julho de 2010
Take for me
Aproveitei a luz do quarto e me ajoelhei. Não consegui dizer nada, além do pedido de ajuda num balbucio. Pedia um encontro, meu coração gritava.
Sai de sua presença triste. Realmente triste. Uma vontade boa de chorar apertava meu peito, mas nem as lágrimas me acompanhavam.
Depois de tanto sorriso sincero, meu coração espremeu, desespero veio levemente e de repente se instalou sem dizer por que.
Um desabafo, amigos ao socorro, as lágrimas rolaram grossas. Reaprendi a soluçar. Chorei com todo corpo.
A água inundou tudo, molhou o roxo do vestido. A onda trouxe o profundo e eu entendi: medo de viver do mais autêntico. Medo de usar os dias sem saber se são mesmo para o que tenho feito.
Quando a margem cessou, sequei os olhos ainda marejados e num agradecimento sem palavras senti o que precisava: a falta de certeza, mas a doce presença em qualquer caminhada.
Não se turbe o vosso coração; credes em Deus, crede também em mim. João, 14:1 -
Por Natália Oliveira
A Vida
Quero uma felicidade permanente, sorrisos em lábios que me beijem. Quero, não a ausência de problemas, mas as mãos que se unem para resolvê-lo. Quero um poema que cante a eterna presença daqueles que se foram. Quero a vida, a vida bem sentida. Quero as lágrimas que suplicam um afago acessível. Abraços demorados, gargalhadas que nos levem ao chão. Quero amor eterno, destes que não se encontram mais. Quero amor, destes que não se compram nem se vendem, mas que se recebe de graça e pela graça de uma doação sincera, sensível e simples. Eis o meu ideal de Vida.
Um dia encontrarei esta Vida.

Por Renato Marques, meu amigo. Meu fiel e bondoso amigo.
Visitem o coração dele: http://poemado.blogspot.com/
sexta-feira, 2 de julho de 2010
Sobre meu lado mediano
Eu assumo meu lado mediano e desde então a gente convive bem. E é um bem para melhor, com leveza e picos de felicidade. Já não há espaço para pressão, mandei-a embora por justa causa. E deixei avisado na portaria: caso ela volte mostre o aviso colado na fachada “não aceitamos comparações”.
Eu sei o tamanho do meu lado mediano, não preciso de dedos apontados para lembrá-lo. Sei que ele é um gigante diante de uma menina, mas ela tem uma vida inteira ainda. E tenho dito: nada de receber caixas de ultimatos e sacos de prazos, um passo atrás do outro, direto para casa e cara nos livros. E pernas na estrada. E mercúrio nos joelhos. E experiências das cicatrizes.
Eu sei o tamanho do meu lado mediano e já preparei o tênis, por isto não me venha com teorias prontas, porque é na margem que eu me encontro. São das pegadas menos exploradas que eu trilho o meu caminho. É sem pressa e nos intervalos que entendo de tudo. É na rua, é no meio, é no cheio.
É na conversa com ilhas, com amigos, comigo. É me carregando às vezes, é me abandonando outras, é me reconhecendo. É no foco da busca, é na direção contrária, é no destino mutável, é na estrada de gente. É ao lado do meu lado, é na direção da minha vida, é na busca dos meus desejos, é na força para vencer os medos. É na certeza do meu mediano, é no perceber das minhas falhas, é na disposição para consertá-las, que eu chego. Eu chego.
Por Natália Oliveira
quarta-feira, 30 de junho de 2010
Pérola Negra
Desci do ônibus e você tava lá, sentado. Mas antes mesmo do motorista abrir a porta já te via, você não, ainda. Me aproximei e perguntei de você a você, sua resposta foi linda como a outra, um sorriso aberto de afastar os dentes, todos marrons. Sem palavras você esticou o braço, fui ao seu encontro e ganhei um presente estalado, gostoso. Estiquei as costas, mas você me chamou de novo, curvei o tronco e com leveza você juntou o meu rosto ao de sua “mama”. Ela abriu os lábios num sorriso, faltava um dente, mas era incrivelmente bonito, como o seu. Sorrimos os três. Atravessei a rua e antes de me entregar a corrida de atraso, olhei para o lado, você abria os braços pedia um abraço.
Certa vez ouvi dizer que a vida é um mosaíco, gosto da ideia e busco organizar as minhas peças. Algumas encontro em mim, outras em minha família, outras nos meus amigos, mas há aquelas que exigem mergulho e disposição para encontrá-las, não são vistas diariamente, é preciso treino, desprendimento. Ainda assim, viver sem elas é como pegar uma concha e se perder em suas cores, sem ao menos notar a beleza da pérola.
Por Natália Oliveira
terça-feira, 29 de junho de 2010
Flaques d'eau Noire
Das perguntas que fiz, só respondeu que trabalhava em casa de família e que lá ninguém parava para ver partida. Depois se concentrou em me contar a história de sua vizinha e a luta para conseguir emprego. “Ela não tinha faculdade, se sentia burra, mas era esforçada, sabe?” Sei, pensei. “Ai ela queria muito entrar numa empresa e os outros candidatos tinham muito mais preparo, só que ela era esforçada e acabou conseguindo.”.
Contava sem olhar para o meu rosto, mas às vezes, de repente, olhava fixamente em meus olhos, franzia um pouco a testa e com um ar de estranheza silenciava. Algo de pueril transbordava naquelas pequeninas poças negras, eu mergulhava. Do assunto da amiga, me falou do seu companheiro. Daquele que ela pede para dar uma força para a seleção ganhar. Recitou de cabeça algumas palavras Dele e me deixou o Salmo 112 para desfrutar.
Entre um letreiro e outro, apareceu o meu destino. O ônibus parou além do ponto e as pessoas subiram ligeiras. Antes de deixá-la, perguntei seu nome. “França e o seu?”. “Natália”. Numa nítida surpresa ela sorriu com empolgação. “Minha filha adora este nome”, disse e acompanhou meu caminho em busca do ônibus, que já se preparava para sair. Deixei França ali, em Santo Amaro. Cheguei em casa, abri a bíblia, li o salmo, fechei o livro com um sorriso, fazia graça. Geografia de pele morena, poças negras e ar sereno, ali, do meu lado, entre a rua e a calçada... e eu todo este tempo em busca de mapas...
Por Natália Oliveira
sábado, 26 de junho de 2010
Damas primeiro
quinta-feira, 24 de junho de 2010
Logo
Surdez
Surdez consciente é a pior coisa que existe, porque cala o coração alheio na marra.
Surdez afiada machuca, porque obriga a esperar uma vez que não vem, não vem.
Por Natália Oliveira
domingo, 20 de junho de 2010
Diá rio
Por Natália Oliveira
quinta-feira, 10 de junho de 2010
Alimenta de que?
O refeitório estava cheio. Num gesto de nítido desespero levantou a porcelana da bandeja e sem saber o que fazer retornou-a no mesmo lugar. Percebendo o movimento, uma das atendentes recolheu a louça e pediu para que ele pegasse uma outra, limpa. Ele foi, eu sai em busca de uma mesa. Sentada o vi passar com o prato vazio, depois de alguns instantes. Olhei para os seus olhos numa tentativa de lhe dar conforto, ele só olhava para frente, parecia com pressa.
Por Natália Oliveira
sexta-feira, 4 de junho de 2010
Pérola Negra
Desci do ônibus e você tava lá, sentado. Mas antes mesmo do motorista abrir a porta já te via, você não, ainda. Me aproximei e perguntei de você a você, sua resposta foi linda como a outra, um sorriso aberto de afastar os dentes, todos marrons. Sem palavras você esticou o braço, fui ao seu encontro e ganhei um presente estalado, gostoso. Estiquei as costas, mas você me chamou de novo, curvei o tronco e com leveza você juntou o meu rosto ao de sua “mama”. Ela abriu os lábios num sorriso, faltava um dente, mas era incrivelmente bonito, como o seu. Sorrimos os três. Atravessei a rua e antes de me entregar a corrida de atraso, olhei para o lado, você abria os braços pedia um abraço.
Certa vez ouvi dizer que a vida é um mosaíco, gosto da ideia e busco organizar as minhas peças. Algumas encontro em mim, outras em minha família, outras nos meus amigos, mas há aquelas que exigem mergulho e disposição para encontrá-las, não são vistas diariamente, é preciso treino, desprendimento. Ainda assim, viver sem elas é como pegar uma concha e se perder em suas cores, sem ao menos notar a beleza da pérola.
Por Natália Oliveira
sexta-feira, 28 de maio de 2010
Sapato Apertado
Às vezes angustia. É como precisar calçar um sapato que não lhe cabe mais. Sentir o couro lhe estourar bolhas, rasgar a pele, manchar a meia de sangue e ainda assim persistir, continuar caminhar. É como sentir que tudo se resume ao apertado, ao pequeno, ao impróprio demais. É como se de repente o sol de dentro saísse rua afora e se escondesse em algum lugar jamais conhecido.
Às vezes angustia. Na imensidão do mundo, ainda me falta espaço. Conhecimento tem hora que prende asas, sufoca. Há momentos que, mesmo diante de tanto chão, muros de notícias me coagem, me espremem, me aprisionam. Assustam! Então, tudo que desejo é lavar a alma. E a água vem. De enxurrada, de várias fontes-faces. É um cenário dolorido, é como ver o coração partido, ver o amor jorrar. Sofrido.
O silêncio cala a alma contrita. Coisas profundas dificilmente alcançam à superfície.
Subi no ônibus e logo mergulhei na primavera de Clarissa. Pétalas amarelas, azuis. Um piano de fundo, uma música sem coesão a tocar, o avião a cortar o céu. Uma conversa infantil, doce, insistente. Fechei o livro. A voz suave continuava a falar, olhei para o lado. Parecia uma pintura. Olhos redondos, negros e vivos, num rosto marrom forte. Perguntava coisas do mundo à mãe. Não tinha mais do que quatro anos.
Voltei a ler, ele a falar. Espichei o pescoço, desviando da mulher recém-chegada, lá estava ele grudado na janela. Voltei à Clarissa. Minutos depois percebi que minha cabeça não estava mais ali, guardei a companhia da menina dentro da bolsa. Ele olhava atento cada gesto meu. Sorrimos. Os dentes pequeninos e alinhados brincavam com um chiclete e ao mesmo tempo afastavam as bochechas num alargar de lábios. O retrato era, certamente, uma poesia. Meu coração acalmou.
Coisas profundas dificilmente alcançam à superfície, mas há quem encontre o sol em terrenos inférteis e oferte aos carentes de alegria.
Conhecimento tem hora que prende asas, mas agora eu posso buscar a ]ausência dele em sua poesia.
segunda-feira, 24 de maio de 2010
Ao contrário de
Por Natália Oliveira
sexta-feira, 14 de maio de 2010
As Ruas Falam
Por Gay Talease
segunda-feira, 10 de maio de 2010
Medo de Escuro
domingo, 9 de maio de 2010
À minha
Os cabelos finos carregam a imagem da primeira boneca, feita de espiga de milho, que ganhava vida em mãos pequenas e roliças. Corriam de um lado para o outro, pés descalços, sujos do jardim de barro da casa simples. Na infância, pais e mães separados, na vida adulta, a melhor referência de família que poderia entregar de graça presente.
É dona de uma olhar de super heróis, identifica qualquer dor camuflada, por mais escondida que esteja, e diante de qualquer segredo necessariamente confidencial, silencia.
E do significado que leva, é uma das mais bonitas personagens, mãe da forma mais bela. À minha em especial, mas deixo meu abraço a todas, por nos darem o privilégio da vida.
Por Natália Oliveira
sábado, 1 de maio de 2010
Enoque, Fernanda, Eu
sexta-feira, 30 de abril de 2010
A Partir De
quarta-feira, 28 de abril de 2010
Me dá um presente?
quinta-feira, 15 de abril de 2010
Eu Ela Meu
Por Natália Oliveira

