segunda-feira, 21 de julho de 2008

A velha da montanha



No alto da montanha a velha morava. A velha bruxa. Dizem que ela virou bruxa depois que o velho dela a deixou. Foi num dia frio, muito frio, as estrelas brilhavam forte no céu e todos do vilarejo já estavam dormindo. Deitada, estava quase pegando no sono, quando o velho se levantou. Ela abriu os olhos devagarzinho, mas seu corpo cansado não a permitiu acompanhá-lo. Era um cansaço diferente, um cansaço pesado, engraçado. Estranho!
Ela então dormiu e no dia seguinte ao seu lado, ao invés do velho, encontrou um bilhete que dizia: “Fui levado! Capturado! Não sei! Não saberei! Nem você”. A velha ficou doida. Passou dias chorando. Um choro alto, que era mais grito do que choro. Todos do vilarejo abriam suas janelas, mas tinham medo de consolá-la. E ela ficou sozinha.
Até que os dias passaram, e na porta de sua casa a velha encontrou outro bilhete: “Fui levado! Capturado! Não sei! Não saberei! Nem você. Preciso do seu maior bem. Coloque-o aqui, que me soltarão”. A velha deu um grito. Arrancou um bocado de cabelos e saiu correndo pela casa adentro.
Abriu todos os cadeados de sua caixinha de aço, e arrancando todas as suas jóias de dentro, deixou-as em frente a sua porta de casa. Puro ouro.
Quem passava pela casa via a velha na janela, olhando para os colares e anéis no chão, falando sozinha, esperando o velho. Mas ninguém apareceu, nem o velho, nem ninguém.
Sem perceber a velha começou colocar tudo que tinha fora de casa, sofá, televisão, cama e até chuveiro. Puro ato de desespero. Coitada!
E ninguém aparecia. Nem o velho, nem ninguém. E o povo pensando que ela era bruxa. Também, com aquela cara assustada e aquele olho esbugalhado. Podia ser diferente?
Só sei que passaram os anos, os dias, e tudo que a velha tinha ela colocou do lado de fora. Tudinho, até o papel higiênico do banheiro, já pensou? E não tinha mais coisas, nem bilhete. Sem sinal, sem dicas, ela desistiu e se mudou para a montanha. O velho? Ficou preso, presinho da Silva só porque a velha não sentou na porta. Só porque ela não colocou o coração na porta.
Por Natália Oliveira

segunda-feira, 7 de julho de 2008

Têm horas que a vida pede





Têm horas que a vida pede mudança. Mudança de hábito, mudança de trabalho, e muitas, mas muitas vezes mudança de vida. Não aquela mudança de você para ele, nem dele para você. Nem de todos para você, ou de você para todos. É aquela mudança de você para você. De você por você! De mim para mim. De mim por mim.
É essa mudança que fortalece, que fortifica, mas que principalmente: Transforma! Não transforma a sua vida, mas a sua maneira de ver a vida. E isso vai lhe bastar para que você viva bem.
É aquela hora que você precisa ser mais você. É aquele momento, decisivo, que você precisa acreditar no que você é, em tudo que você criou, e acima de tudo em tudo que Ele criou para e por você!É você se olhar no espelho e acreditar no que vê. É tirar da sua “lista de restrições” que você não pode se valorizar, que não pode se admirar em público. É, ao contrário, gritar pro mundo o quanto você é feliz. É não torcer o nariz quando alguém diz que se gosta, é se gostar também!
Não é ser egoísta, é ser solidário. Ninguém quer ser atendido por um dentista com dentes estragados. Para ser exemplo para os outros, sejamos primeiro o exemplo. Cuide de você! É fazer a diferença em você, que sem perceber você fará a diferença em todos que olharem por você.

Por Natália Oliveira

Memórias de um dia de Trabalho


Véspera de feriado, relógio marcando 22 horas, não é um bom horário para trabalhar, mas existem pessoas com fome e eu preciso atendê-las. Trabalho para uma grande rede de fast food numa empresa que fica bem perto da minha casa. Junto comigo, milhares de pessoas anotam pedidos e tentam achar a melhor forma de oferecer sobremesas e bebidas para os clientes, que na maioria das vezes, nervosos com a insistência, disparam palavrões.

Silêncio em uma central de atendimento com mais de cem funcionários é quase raro, mas acontece. Sem ligações, procuro algo para me distrair, tento achar algum joguinho, um recado esquecido no bloco de notas, mas nada encontro. Fico, então, me balançando em minha cadeira, torcendo para que o tempo passe logo e eu possa, enfim, depois de boas horas de trabalho chegar em casa, dormir e me animar para a jornada de 10 horas de trabalho do dia seguinte.

Minha vida, ultimamente é essa: trabalho, universidade, curso de línguas, livros e força para responder as expectativas da sociedade. Quando sobra tempo consigo ficar com minha família e amigos, o que me faz um bem danado, e é isso que penso enquanto as ligações não voltam. Sem perceber uma mulher de cabelos grisalhos e bochechas rosa, sentada ao meu lado, me observa. Quando a encaro, vejo sua pele marcada por linhas do tempo. Logo deixo de olhá-la.

É então, que sinto sua mão roliça em meu braço. Percebendo a aproximação, inconsciente, abro um sorriso que é retribuído logo depois. Sem perceber começamos uma conversa. Aos poucos tento desviar das gotinhas de cuspe que saem de sua boca larga e trazem um pouco de branco para minha blusa preta, enquanto mexo minhas pernas que estão doendo por estarem tanto tempo na mesma posição.

E quanto mais fala de seus filhos, casamento, casa e vizinhos, mais gargalha. Imagino que ela sim é feliz. É então que de repente sua expressão muda, seus olhos pequenos e afastados ganham um brilho diferente. Um brilho de lágrimas. Antes que possa perguntar, com um sorriso singelo, ela me diz que muitas vezes tudo que se diz são apenas sonhos.

Estendo meus braços e ela permite. Ficamos ali, então, abraçadas como se toda a dor que invade o meu peito e o dela pudesse sumir. Meu mundo de tudo, que sufoca: Trabalho, universidade, curso de línguas, livros e força para superar expectativas, e o mundo dela de nada, que falta: Casamento, filhos, casa e vizinhos...

Por Natália Oliveira