terça-feira, 30 de junho de 2009

A gente contou e o final não foi feliz!

O final de semana chegou e para variar os meus programas não incluem minha casa. Ainda assim, hoje consigo sentar-me a mesa do café da manhã. Despejo o leite na xícara e espero a pergunta que não demora “Quantas coisas você marcou para fazer neste final de semana?”. Respondo em meio às gargalhadas. “Bom dia, mãe”. E ouço mais uma vez. “Essa tem rodinha nos pés”.
Horas depois o ambiente é diferente. Ainda é casa, mas não a minha. O clima é gostoso, de amigos, frutas com chocolate e alguma risadas. Enquanto desfruto do momento, a presença inquietante e empolgada de um pedaço do céu me traz de presente uma gargalhada cheia de brincadeira, de infância. O sol atravessa a porta e lembra que algo nos espera.
Enchemos o sofá, o documentário 174 a tela da tv. Sandro nasceu e viveu na pobreza, no lado da vida que ninguém vê. Aos seis anos, momento em que eu via Popeye, Sandro assistia homens maus tirarem a vida de sua mãe. Cresceu sem pai, sem esperança. Foi para rua ‘não viu saída, foi pedir para comer, para não morrer roubou.
O menino cresceu. E enquanto eu aperto os lábios com os dentes, ele mostra os que a falta de escova o fez. O seqüestro do ônibus 174 é claro, é visto por uma sociedade que grita, chora, xinga. O menino, Sandro, ouve e eu desconfio que algo lhe faz lembrar dos tempos de fome, que negaram comida, que era inocente, que era sedento de amor. Dos tempos que ainda tinha jeito, mas só encontrou olhares de horror.
A ultima cena dança até agora na minha cabeça. Dança ao som de uma música que me acusa. Uma música escrita por Sandro. Por meninos de rua. A letra é única. Hipocrisia. A letra acusa. Por que ninguém ajuda? A letra aponta os defeitos de meninos de casa, que viram a cara, mas não param de acusar. Maldito. E ai eu me pergunto: o que a gente faz para sarar? O que a gente faz para ele não matar?
Obs: Não concordo com o que Sandro fez, nunca serei a favor dessa lei que matam homens de bem. Só não aceito ultimatos, julgamentos pré-julgados. Somos participantes ativos de muita coisa. Só a gente não vê. Só a gente não quer vê.
Por Natália Oliveira

quarta-feira, 24 de junho de 2009

O que você tem feito?

Encontrei os papéis perdidos em minha mesa e corri para o carro que me esperava há algum tempo. No balanço de lombadas e ruas mal asfaltadas reli as perguntas formuladas na véspera. O sol atravessava as janelas da Kombi e esquentava o meu rosto.
O trajeto é uma reta só, diferente da conversa que tenho com o motorista, cheia de curvas. Desconfio que falar sobre alimentos, crise e carreira não resultem em um assunto coerente, mas ajudam a chegar logo.
Estendo minhas mãos e recebo os equipamentos que o cinegrafista, sozinho, não consegue carregar. O cenário é diferente, cheio de árvores, flores coloridas e bancos de concreto capazes de suportar a admiração do pedaço natural.
Logo formamos um trio. A câmera, o microfone e o meu entrevistado estão posicionados. Eu também. Começo as perguntas sobre os cupins. Prevenção, características, habitat e... receitas caseiras são eficazes no combate?
O professor de Zoologia tem cabelos loiros, olhos claros e uma pinta de ator hollydiano. O rosto dele está iluminado e sua boca abre e fecha numa empolgação de domínio e prazer, de quem sabe o que diz. Desperto.
“Natália, as pessoas misturam fumo de corda com querosene e colocam na madeira, isso é combatê-los superficialmente. Nos lugares que não conseguimos ver, naquele armário fundo, naquele cômodo que a gente mal entra, eles continuarão agindo. A gente precisa achar a origem para dedetizar...”
Recolho as coisas e me entrego ao caminho de lombadas. O balanço do carro, agora, embala o som do martelo que prega as respostas. “Nos lugares que não conseguimos ver, naquele armário fundo, naquele cômodo que a gente mal entra”
E eu penso. O que tenho feito com os cupins da minha vida? Quais são os cômodos e os armários fundos que mal entro, mal vejo? Tenho procurado suas origens? Tenho combatido eles com receitas caseiras? Ou tenho me preocupado em jogar uma mistura de corda com querosene só para superficializar o que não sei tratar? É algo a se pensar. Pensar. A propósito, o que você tem feito?
Agradeço ao professor de Zoologia da Unisa Carl Heinz Gútschow pela entrevista.
Por Natália Oliveira

segunda-feira, 22 de junho de 2009

Vida de Campo

Para seguir a história dos longos feriados, o sol só apareceu no último dia, junto com a ideia de ir embora mais cedo. Arrumamos as malas, recolhemos os papéis de chocolate da véspera e nos despedimos da velha ilusão, que a segunda-feira não chegaria tão cedo. O último entrou no carro e bateu a porta. A chave girou e o motor ligou. Deixamos o pedaço de verde mesclado de colorido, num espaço que nem parece São Paulo.
A luz iluminava a estrada de terra. Na ausência de música, conversávamos sobre as casinhas sem cerca que contornavam o caminho. Umas repletas de flores, outras de rede. Ora animais grandes, ora pequenos. E por falar neles, uma lombada criada, sem sinalização, no meio da estrada. “Isso é para brecar os paulistas, que não sabem de campo e atropelam as galinhas.”
Um dia sem armas, só com lombadas, a gente chega lá. Só na parada.
Por Natália Oliveira

quinta-feira, 18 de junho de 2009

Passageiro não

Fim de matéria. Agradeço o entrevistado, recolho os papéis estranhamente organizados e atravesso a porta de vidro de mais um consultório de São Paulo. Menos uma, penso enquanto espero o táxi já programado para as quatro. Não sei o que me prende a atenção, mas o toque do celular me desperta. A voz do outro lado avisa, “o motorista está disponível”.
Caminho pela rua movimentada em direção ao carro, que agora enxergo. Nosso primeiro encontro é ali mesmo. Ele está do lado de fora e confirma se quem chegou é quem espera. “Natália?”. “Sou eu”.
Permanecemos quietos por alguns minutos, que a falta de amizade não consegue constranger. Ainda assim, qual o motivo para não conversar? Em menos de dez minutos desfruto de um assunto divertido e contemplo um sorriso quase raro.
Meu companheiro de viagem chama-se Vicente, descubro momentos mais tarde. Sereno, desvia com calma da falta de experiência e da pressa de São Paulo. “A pessoa já deve tá tremendo por fazer coisa errada. Se eu buzinar ela vai ficar mais atrapalhada. A gente precisa amar o outro, foi assim que Jesus disse, né?”. Concordo em meio a sorrisos.
Estamos há duas quadras do meu destino, por isso seu Vicente acelera a última conversa. “Tem passageiro que pede para eu fazer um caminho. No meio do trajeto ele não lembra se é direita ou esquerda. A gente chuta junto e a culpa é minha. Vê se pode!” Me entrego às gargalhadas. “Felicidade ou infelizmente, eu trabalho com gente”, diz.
Antes de descer dou lhe o que devo e lanço-lhe um último olhar. Desejo-lhe vida longa e, mesmo sem querer, viro as costas e me entrego às escadas costumeiras da TV. Penso em Vicente. Chego à minha mesa, olho os bilhetes grudados, os textos inacabados e os prazos apertados. De olho em tudo que preciso fazer sento e escrevo esse texto,
pois se Vicente estivesse aqui ele faria o mesmo. "O importante é saber viver bem, do nosso jeito".
Ao seu Vicente. Cabelos crespos de algodão e pele negra sem linha de expressão. E se você tem problema levanta a mão. Seu Vicente traz um dente de ouro e tantas histórias, que dá coleção. Ele tem a solução! Uma tremenda e gostosa contradição. Passageiro não!
Por Natália Oliveira

domingo, 14 de junho de 2009

Par de Páginas

Literatura para mim é assim. Causa e efeito!Doses incertas de batidas no peito. É tremedeira sem frio, suor sem calor. São os olhos confusos de quem olha e úmidos de quem lê. É a verdade na palma da mão, é mágoa, é alegria no fundo do coração.
Nunca entendi rostos pálidos e sem cor diante de livros, já que para mim eles sempre foram mistérios sem fim. Tesouros a serem descobertos nas prateleiras das salas e bibliotecas de um lugar ou qualquer afim.
Minha mãe diz que sou forte e, até um pouquinho pesada, sou assim pq. além de feijão e arroz devorei livros. De todos os tipos e gostos. Uma vitamina de diversidades que sempre me agradou e me alimentou até os dias de hoje.
Nunca fui culta e lendo-os nunca pretendi ser. Se um dia for, chamem de conseqüência, mera conseqüência. Como quando criança, nunca tomei vitaminas de frutas por serem ricas em B12 ou em “C’s”, mas por deixarem a minha boca com gosto de frutas. Assim foi com os livros.

Se pudesse embrulharia vários deles em cápsulas secretas e engoliria todas de uma vez, só para sentir a causa e o efeito, só para sentir as batidas no peito. E mesmo que algum livro parasse meu peito, eu ainda os amaria como o meu par perfeito. Meu prefeito. Ele dita minhas leis.
Por Natália Oliveira

sexta-feira, 5 de junho de 2009

Colou na minha memória

Nunca fui linda e quando adolescente nem bonitinha. Usava óculos, cabelos trançados e um corpinho modelado a garrafa. Quadril estreito, costas largas e umas blusas coloridas demais, com calças, muitas vezes, soltas ou apertadas demais. Mesmo fugindo de todos os padrões perfeitos, estive sempre rodeada de amigos, muitos deles. Afinal de contas, se não tem beleza, tem simpatia.
Minha sala foi a mesma desde a quarta-série, cheia de adolescentes engraçados e sem maldade. Crescemos em meio ao pó de giz, às regrinhas de matemática, que sempre nos pareceu tão insignificantes e às gargalhadas contínuas, que me renderam o apelido de sorriso.
Mesmo comparado às aulas de educação física, o recreio sempre foi nossa dose diária de alegria. Com as minhas amigas inseparáveis, subia os degraus do escadão largo de cimento, construído no pátio, e de lá de cima a nossa mais prazerosa atividade ganhava vida: comer salgadinho de isopor e discutir os próximos capítulos da novela.
Uma vez combinamos de cabular aula, achei super emocionante a ideia de sair da sala antes que a professora chegasse e se esconder no banheiro. Ficamos lá por um bom tempo, uma em cada cabine, “vai que alguém dedura” e no final das contas descobrimos que a aula deveria estar mais prazerosa.
E o tempo foi passando e eu decidi que queria ser escritora. Ganhei apoio total de um amigo meu, que depois se divertiu com os meus rascunhos. Ria das palavras que eu escrevia e eu gostava da risada dele. Passávamos tardes e tardes ao telefone, mesmo depois de uma manhã inteira na escola.
Hoje eu lembrei dos meus tempos de escola e de como eles colam na memória.
A todos meus amigos.
Por Natália Oliveira!.

quinta-feira, 4 de junho de 2009

Até que a Morte Nos Separe

No último sábado, 30, Carlos Eduardo e Bianca Machado trocaram alianças e promessas de amor. Enfim, depois de três anos, o casamento aconteceu em meio à natureza colorida e cheia de forma do Iate Clube Niterói, localizado em dos municípios do Rio de Janeiro. Coqueiros, árvores floridas e um cais fizeram parte do pano de fundo da celebração que, segundo uma parente de Bianca, não ficou atrás de um “conto de fadas”.
A noiva deu vida a um vestido rico em rendas e levou em seus cabelos flores brilhantes e delicadas. O rosto fino e jovial recebeu pouca maquiagem, mas mesmo com os lábios levemente tonalizados o sorriso era vivo e cheio cor. Bianca era romântica, recém-formada em medicina, estava feliz e no auge dos seus 25 anos, confirmam os familiares.
O noivo atuava na Procuradoria Federal Especializada junto à CVM (Comissão de Valores Mobiliários) no Rio, mas na noite do casamento sua atividade era outra, receber os votos de felicidade e comemorar, junto com Bianca, o resultado de todos os preparativos e cuidados para que a noite marcasse a união de forma perfeita.
Juntos posaram para as lentes profissionais e amadoras, sempre com a mesma disposição, com o mesmo sorriso. Às vezes ensaiavam beijos, outrora abraços. "Os dois estavam muito eufóricos e a moça me surpreendeu pelo jeito simples dela", contou ao jornal Estado de São Paulo um dos funcionários do Iate Clube.
O salão dourado, cheio de flores e arranjos, foi aberto às 20 horas e contou com amigos e parentes dos noivos até às 3 horas da madrugada de domingo, quando o casal deixou à festa e, depois de algumas horas, seguiu em direção ao Aeroporto Internacional Tom Jobim.
Embarcaram no voo 447 da Air France com destino à Paris. Carlos e Bianca sonhavam com a lua de mel na Europa. Entraram no avião repleto de poltronas ocupadas, ao todo 216 passageiros, e acharam aquelas que os esperavam. O piloto se preparou e o avião decolou às 19h00 do domingo, último 31.
O pouso deveria acontecer na manhã de segunda-feira, no aeroporto Charles de Gaulle, em Paris. Ainda por motivos desconhecidos não foi esse o final. O planejamento de uma nova vida se perdeu no mar. Viva ficou a promessa de amor feita no altar horas atrás “até que a morte nos separe”.
"É o mistério profundo, é o queira ou não queira...é o fim do caminho" Tom Jobim
Por Natália Oliveira