quarta-feira, 26 de agosto de 2009

Já viu?

Você gasta o seu dinheiro com o que?
Pois eu vou te contar que você pode deixar todas as suas moedas no bolso e contemplar o céu. Ele traz um azul de vários tons e uns brancos fofos, que dá vontade de pegar. Se der sorte, pode presenciar a mais linda faixa colorida já tecida.
O auditório não é muito estruturado, mas a ventilação é boa, às vezes traz até uns pingos de água. Refrescante. E se você ficar com frio, é só procurar um cantinho pintado por um amarelo morno.
As cadeiras não são de madeiras e nem estofadas, são retas de um mesclado verde e marrom. São modernas, você tira os sapatos e mexe os dedos para sentir leves cócegas. Têm também alguns pilares marrons, com o topo verde. [Quando ninguém tiver vendo, abrace-os e sentirá uma gostosa euforia.]
O aroma vem de umas flores. De todas elas. Diferentes, mas não sem cor. São pequenas e trazem na sua delicadeza toda a grandiosidade. Para não se sentir sozinha, eles soltam alguns pequenos bicudos de asas. Eles conversam sem parar.
Você gasta o seu dinheiro com o que?
Pois eu vou te contar que você pode deixar todas as suas moedas no bolso, seu sorriso no rosto e nem precisa se trocar. É só contemplar.
Por Natália Oliveira

quinta-feira, 20 de agosto de 2009

Além do pecar

Eu aprendi algo que alguém aprendeu com outro alguém. “Pecado é aquilo que a gente faz contra a gente mesmo”. Todas às vezes que errei, deitei com o meu erro. Fui eu que agüentei os meus pesadelos, o meu peso. Por mais que magoei, fui eu que carreguei o saco de lágrimas, de choro reprimido, de arrependimento. Fui eu todas às vezes que carreguei.
Quando julguei, fui eu que me desfigurei. Me desfigurei da ideia que eu também posso falhar. Quando eu julgo incorporo a filosofia da perfeição e tudo que é 100% certo, tem a mesma quantidade de ilusório.
Pecado é aquilo que eu faço contra mim. Contra os meus conceitos, contra a minha vida. É a sensação de que a conseqüência tem um peso que eu pouco posso suportar e que eu vou precisar carregar. O meu erro é contra mim. O seu contra você. E isto não tem nada a ver com religião e sim com carne e coração e a sua lingufaca de cortar. É só pensar.
Por Natália Oliveira

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

Pode?

Se a gente soubesse que tudo é tão rápido.
Se a gente soubesse que tudo é tão raro.
Se a gente soubesse que a gente só tem uma.
Se a gente soubesse o verdadeiro “invalor”.
Se a gente soubesse que vale mais um sorriso.
Se a gente soubesse a dor do menino.
Se a gente pudesse inverter tudo.
Se alguém pudesse nos inverter.
Se a gente pudesse aprender com alegria.
Se a gente pudesse errar sem sofrer.
Se a gente pudesse fazer o que tem que fazer.
Se a gente pudesse realmente viver.
Se a gente pudesse não complicar.
Se a gente pudesse se entregar.
Se a gente pudesse parar de pensar que pensa.
Se a gente pudesse só fazer o que tem para fazer: viver.
Se a gente pudesse.
Se a gente desse.
Por Natália Oliveira

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Medo. Estava confesso.

Medo. Eu estava, confesso.
Desci no terminal de ônibus, como combinamos, há uma hora antes do combinado. Para preencher o tempo fui ao banheiro, acompanhei levas e mais levas de passageiros, li parte do meu livro. Deu tempo para eu me arrepender de gastar o único dinheiro que tinha em bolachas ao invés de pães de queijo. Até que você chegou.
Quando te vi, senti que você trazia o suficiente para você e para mim, por isso, não havia motivos para desistir. Ainda assim, eu estava com medo, confesso. Subimos as escadas próximas e logo estávamos na rua. Já tinham mudado o tom da noite, bem mais escura. Desviando dos desconhecidos, segui suas pernas pequeninas, já tão habituadas com aquele caminho.
A nossa próxima parada era um ponto cheio, de gente, de bancas, de churrasco, de pressa com cheiro de cigarro. Mudamos de cenário, quando um ônibus lotado parou. Nós subimos. Encontramos um espaço dentro do estreito e no ritmo das lombadas travamos uma conversa animada. Há tanto tempo sem se ver, nada melhor do que falar sobre o que a gente escreveu.
O motorista corria e eu, de tempos em tempos, aproveitava para olhar o que me cercava. Não demorou para andarmos sobre aquela paisagem que nada parecia com uma chácara. O ônibus dava nome a um lugar que não existia. O que eu via eram casas e um beco de paredes pixadas, logo o atravessamos.
Saímos em uma avenida, pouco movimentada. Alguns metros mais e chegamos. Percebi que toda aquela ausência de gente, faltava naquele lugar. Redondo, cheio de cadeiras, mesas, livros e sorrisos, percebi que ali tinha música, tinha violão, tinha famílias inteiras. Ali batia um monte de coração. Ali, naquele lugar, era o Zé do Batidão, a sede da Cooperifa.
Atravessamos a multidão e alcançamos um lugar na escada lateral, que tempos depois ficou lotada. Meus olhos passeavam nos rostos, nos jeitos, mas principalmente em tudo. Sentia uma ânsia de engolir aquele clima de paz, uma vontade de gritar para todo mundo que ali tinha mundo. Não sabia explicar a explosão de sentimentos, a surpresa, por isso alguém fez isso por mim. “Quando todo mundo espera bala perdida aqui, a gente faz poesia”.
E a prtir de hoje eu não quero só a minha poesia de muros, de surtos, de preconceitos absurdos. Eu quero a literatura do black, do moleque, da senhora de leque. Eu quero a garra, a fuga das amarras. Eu quero acreditar que dentro do mundo, não existem sub-mundos, existem Raimundos e Edmundos e eles também querem viver.
E ainda que me sobrem impressões maravilhosas, eu me calo. "O silêncio é um prece".

À Dayse, meu pequeno sol e a cooperifa e seus poetas marginais. * Aspas de Sérgio Vaz*

Por Natália Oliveira

sábado, 8 de agosto de 2009

De volta para mim

Acordei, não feliz por ser sábado. Um cansaço misturado a uma boa parcela de angústia e medo despertou comigo. Sem motivos aparentes e sem coragem para descobri-los, deixei minha casa para um dos compromissos combinados durante a semana.
O sol estava quente, o cigarro dos desconhecidos esfarrapados ao meu lado também. Passei por eles sem me atentar a dor que traziam na alma. O cinza e preto da calçada dançavam em meu olhar. O tom do chão se estendia para os prédios antigos, há algum tempo restaurados. Entrei em um deles.
A palestra não demorou para acabar e nem o meu ônibus para chegar. Aproveitei as revistas, recém-ganhadas e encurtei a viagem lendo-as. Matérias interessantes, Ruy Castro. Por um momento esqueci do meu coração que batia apertado, dos meus olhos ansiosos para ficarem marejados. Meu ponto.
Abri a porta de casa com um desejo incontrolável de deixar tudo que me sufocava do outro lado. Não deu. Atravessei a porta de novo e afundei o botão térreo. Segui a um esconderijo gramado, cheio de forma, que deixaram nascer em meio aos prédios e concreto, daqui. Ali, naquela terra marrom, de verde e rosa, só tinha eu.
Deitei. O céu estava azul claro e eu podia sentir a temperatura do amarelo em meus braços. O som dos pássaros enchiam os meus ouvidos e em minha companhia conversei com eles. Com os joelhos flexionados, mexi os dedos e senti leves cócegas. Um latido sereno, de longe, se mostrava presente. Naquele momento, a natureza me dizia algo.
Me senti à vontade para olhar para mim. Tantas dúvidas, angústias e medos. A cada contato com o meu "eu" um pequeno desespero. Em meio a tantas perguntas sem respostas, um olhar para a pintura sem moldura. Diante de tudo aquilo, nada fazia muito sentido.
Sentei. Alcancei pequenas pedrinhas, que repousavam em minha volta. Fechei os olhos e desejei a presença doce e serena do pintor daquele quadro. Senti que era a hora. Um a um, joguei todas aqueles pedaços brancos. Cada lançamento, um pensamento. Minhas mãos ficaram vazias, meu coração também.
Com uma leveza singular, sai dali. Me encontrei minutos depois numa, das dezenas, piscinas infantis que tem por aqui. Molhei os pés, as canelas. Deixei a água lavar as minhas expectativas, os meus desejos sem fundamento. Deixei ela levar embora todas os meus sonhos alheios, deixei.
Atravessei o portão de ferro. Uma vontade enorme de rir tomou conta dos meus lábios. A alegria brincava comigo e não me deixava enxergar a roupa levemente, suja e molhada. Voltei para casa tempos depois, amiga do universo. Satisfeita. Diante da imensidão, nada faz muito sentido.
Por Natália Oliveira

segunda-feira, 3 de agosto de 2009

Cuma? Não Obrigada!

A cada dia que saio sinto que me atrasei. A cada novo lugar me pergunto pq. demorei. A cada esquina desperto para minha escassez. A cada conversa penso nas coisas que falei.
A cada porta fechada uma memória. A cada canto do mundo uma história. A cada segundo um olho que chora. A cada passo uma velha senhora.
E o mundo não para, mesmo que eu grite. Mesmo que a dor se agite. Mesmo que a cada segundo morra alguém de meningite. E quem liga? Que nasça outra Brigite!
E a cada sabor novo, uma sensação diferente. E quem só come sopa, pq. não tem dente? É crime para quem mente? É salvação para inadimplente?
Lave as mãos com água, sabão e detergente. Olha a gripe suína ai gente! Nada de espirrar no rosto do amigo ou do parente. Aproveita e escova o dente!
Se não tem mais fretado, diga adeus ao penteado. É todo mundo apertado. É ombro a ombro, lado a lado.
Coesão? Dispensável para quem tem coração. Para quem come arroz, feijão e mamão. Pros anormais de plantão.
É bobeira. Não é rosa nem trepadeira, é macieira. É solteira, sorveteira e marketeira. Não gosto de mexeriqueira.
Destino sem rumo. Obrigada não fumo!
Por Natália Oliveira - Participação especial - Mulher Vã