quarta-feira, 24 de junho de 2009

O que você tem feito?

Encontrei os papéis perdidos em minha mesa e corri para o carro que me esperava há algum tempo. No balanço de lombadas e ruas mal asfaltadas reli as perguntas formuladas na véspera. O sol atravessava as janelas da Kombi e esquentava o meu rosto.
O trajeto é uma reta só, diferente da conversa que tenho com o motorista, cheia de curvas. Desconfio que falar sobre alimentos, crise e carreira não resultem em um assunto coerente, mas ajudam a chegar logo.
Estendo minhas mãos e recebo os equipamentos que o cinegrafista, sozinho, não consegue carregar. O cenário é diferente, cheio de árvores, flores coloridas e bancos de concreto capazes de suportar a admiração do pedaço natural.
Logo formamos um trio. A câmera, o microfone e o meu entrevistado estão posicionados. Eu também. Começo as perguntas sobre os cupins. Prevenção, características, habitat e... receitas caseiras são eficazes no combate?
O professor de Zoologia tem cabelos loiros, olhos claros e uma pinta de ator hollydiano. O rosto dele está iluminado e sua boca abre e fecha numa empolgação de domínio e prazer, de quem sabe o que diz. Desperto.
“Natália, as pessoas misturam fumo de corda com querosene e colocam na madeira, isso é combatê-los superficialmente. Nos lugares que não conseguimos ver, naquele armário fundo, naquele cômodo que a gente mal entra, eles continuarão agindo. A gente precisa achar a origem para dedetizar...”
Recolho as coisas e me entrego ao caminho de lombadas. O balanço do carro, agora, embala o som do martelo que prega as respostas. “Nos lugares que não conseguimos ver, naquele armário fundo, naquele cômodo que a gente mal entra”
E eu penso. O que tenho feito com os cupins da minha vida? Quais são os cômodos e os armários fundos que mal entro, mal vejo? Tenho procurado suas origens? Tenho combatido eles com receitas caseiras? Ou tenho me preocupado em jogar uma mistura de corda com querosene só para superficializar o que não sei tratar? É algo a se pensar. Pensar. A propósito, o que você tem feito?
Agradeço ao professor de Zoologia da Unisa Carl Heinz Gútschow pela entrevista.
Por Natália Oliveira

4 comentários:

Éter Na Mente disse...

Como sempre nos conformarmos em arrumar a superfície e esquecemos de atingir as origens. Por que revolver esss mal interno significa encarar, tavez, nossa impotência. Mas vale a pena tentar. E acredito que por mais dolorido que seja, é a única maneira de criar os anticorpos para dores futuras.

Beijos moça. Adoro ler seus textos

Pensamento aqui é Documento disse...

"A humanidade não suporta muita realidade".

Certa vez ouvi essa frase.

Faz sentido!

Obrigada pela visita, adoro tê-lo por aqui!

Beijos

Laurinha disse...

Eu aprendi com vc a dedetizar os cupins, exterminar o que corrói meu coração. Sem tentar aliviar a dor com remédios caseiros e sim encarar a verdadeira causa. Seu texto é uma delícia, seu modo de ver o mundo é fantástico, suas palavras tornam os momentos poesia. Talento!
Parabéns Naty!!

Beeijos

Pensamento aqui é Documento disse...

Lá!

E eu aprendi que um coração gigante e uma dose incessante de bondade se esconderam em você!

E que você é especial e que a gente aprende junto!

Beijos!