segunda-feira, 24 de maio de 2010

Ao contrário de

Eu subia já descalça, com as sapatilhas nas mãos. A calçada do condomínio massageava os meus pés cansados, enquanto a tarde caia de um jeito bonito. O tempo estava fresco, confortável, o céu azul, sem nuvens. Da viagem do ônibus até cruzar o portão, já fazia planos: chegar em casa, deixar a cabeça em silêncio e desfrutar da minha companhia. Delícia! Enfim, sexta- feira.
Já perto do meu prédio, ela me encontrou. Óculos redondos, bolsa pequena nos ombros, cabelos acinzentados e histórias da neta para contar. Éramos vizinhas, há algum tempo, e sempre que podia, fugia dela. Justificável ou não, a maioria fazia. Atrasos, trabalho, compromissos inadiáveis, urgentes nada a convencia parar de falar. Ela sempre dava um jeito de segurar seu braço, a porta do carro, a conversa. Era desesperador, às vezes.
Quando a encontrava no elevador, esperava que escolhesse uma das portarias e fazia o mesmo, escolhendo a contrária. Para não agir com falta de educação, preferia evitá-la. Eu tinha horários e tudo que ela tinha a dizer não cabia em menos de 40 minutos. Eram discursos sobre a família de cientistas, sobre a nova síndica, sobre a vida em São Paulo, sobre mercado de trabalho. Não tinha Jeito.
A última vez que nos vimos foi neste sábado, quando eu saia para trabalhar. Descia os degraus do prédio em direção à garagem, quando ela me encontrou. Antes que eu pudesse continuar, ela me segurou pelo braço me envolvendo num abraço forte, fraternal. Sem afrouxar os braços, disse que ia se mudar e deixava comigo “toda sorte do mundo”. Ao contrário de todas as outras vezes, foram estas as únicas palavras que disse. Ao contrário das outras vezes, eu queria que tivesse falado, que tivesse me feito ficar.
Um aperto no peito, deu saudade.
Por Natália Oliveira

3 comentários:

Daniel Savio disse...

Momentos não voltam atrás, mas sempre há um momento de recomeçar de novo...

Por que não pega o novo endereço e escreve para ela?

Penso que ela vai adorar.

Fique com Deus, menina Nátalia Oliveira.
Um abraço.

Mulher Vã disse...

Ai que dó!

Isso mesmo, escreva pra ela!

Beijo de saudades na Naty

Pensamento aqui é Documento disse...

Dani.

É, não voltam. Boa ideia, farei.

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Saudadones, Vã!

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Beijos, queridos