quinta-feira, 29 de outubro de 2009

Graças aos Problemas Alcançados

Tenho agradecido imensamente todos os problemas alcançados. Nada que me motive estampar faixas, andar em meio aos espinhos descalça ou deixar de comer chocolate. Nenhum sacrifício, tortura ou coisas do tipo. Tenho apenas agradecido de coração os problemas alcançados por ter a oportunidade de resolvê-los.
Tenho dormido sem dedos apontados. Tenho dormido com o tamanho real dos meus problemas, sem diminuí-los ao ponto de sofrer o invisível, nem aumentá-los ao ponto de ficarem maiores que eu. Tenho deixado as formas como estão, sem cores fortes ou apáticas, tenho tido coragem para admirá-las no mesmo tom. E tenho percebido que quando faço isto deixo os meus olhos livres para encontrar a solução.
Tenho me permitido entender que problemas existirão para sempre e eu posso resolvê-los um de cada vez. Não há pressa que me apresse e nem prece que resolva se a disposição não for boa e minha.
Tenho percebido que problema só é problema pq. a gente não sabe lidar. Tenho percebido que a cada vez que preciso resolver algo, preciso resolver primeiro parte de mim e sempre que topo, elimino o conflito na primeira etapa.
Tenho agradecido imensamente todos os problemas alcançados. Tenho percebido que problema só é problema pq. a gente não sabe lidar.
Por Natália Oliveira

domingo, 18 de outubro de 2009

Frase

Gosto de escrever coisas que nem pensei, mas gosto mais de ouvir explicações do que não escrevi. Enquanto houver disposição em conhecer o desconhecido haverá saída. Por Natália Oliveira

quarta-feira, 14 de outubro de 2009

Di tudo

Às vezes coisas tão maravilhosas me acontecem que quando as conto me perguntam: é verdade? E eu respondo com a mais profunda alegria privilégio ou mistério, eu vivi.
Molhei a barra da calça em busca do terceiro ponto de ônibus indicado. Parei junto às pessoas que esperavam feliz por contar com o toldo vermelho da loja de doces, os pingos caiam grossos e o guarda-chuva recém-comprado não dava conta de todos. Sequei o rosto com as mãos, olhei no relógio o horário do atraso e confirmei, com a senhora ao meu lado, “aqui passa terminal Santo Amaro?”. Ouvi, num desespero contido, a resposta. Tentei mais algumas opções, mas ela tinha cabelos brancos tingidos de castanhos, olhos caídos e uma só direção. Não sabia.
Agradeci e enquanto a ouvia se desculpar uma outra senhora me puxava pelo braço. Seus cabelos eram crespos trançados rentes à cabeça, as mechas se fundiam no preto e no branco e a distância entre uma fileira e outra era colorida por um marrom forte, num tom de chocolate. Seus olhos pareciam dois lagos negros grandes serenos e redondos e sua boca carnuda abria e fechava sem parar. Ela me dizia que sabia como eu faria para chegar. Esperei ela falar. Explicava, ditava o caminho e depois me segurava pelo braço com cuidado.
Antes de responder a primeira bateria de palavras, a vi se metendo no meio da chuva, então reparei nos seus pés calçados de meia e sapato aberto. Vestia uma calça gasta azul e uma blusa que cobria seu braço estendido. Tentei me aproximar, mas ela pediu para que eu ficasse ali, não podia me molhar dizia. Trocou algumas palavras com o motorista e logo em seguida me chamou. Entramos juntas e depois de um tempo sentamos assim. Logo chegamos ao terminal de ônibus conhecido aos meus olhos. Descemos.
Agradeci e disse que dali conseguiria. Ela não aceitou. Me puxou pela mão e me levou até o homem que vestia uniforme. Ouvimos tudo, entendi tudo, agradeci tudo de novo, ela quis me levar. Caminhávamos em direção ao próximo ponto, ela na rua eu na calçada. Não me deixava trocar. Mancava, pedia desculpas, tinha problemas no osso, mas não escondia o sorriso. Sorriso sobrado por poder ajudar. Buscaria uns remédios para um doente depois de me deixar. Já perto me entreguei e voltei dos seus braços sem deixar de perguntar. “Seu nome?”. Diná.
“Natália”, respondi e comecei a andar. Alguns passos e ela gritou num tom baixo. “Vai com Deus Natália”. E eu pensei, mas como se acabei de te deixar? E quanto ao mundo, posso te dar para você cuidar?
Às vezes coisas tão maravilhosas me acontecem que quando as conto me perguntam: é verdade? E eu respondo com a mais profunda alegria privilégio ou mistério, eu vivi.
Por Natália Oliveira

domingo, 4 de outubro de 2009

Férias de Mim

Hoje deixo ela ir, sem perguntar onde vai. Hoje quero que vá, que não se preocupe, que não se pergunte onde quer chegar. Hoje quero que ela vá. Quero que vá sem avisar, sem ligar, sem anotar para onde foi. Quero que vá na falta de certeza, na vaga ideia, na ausência de beleza. Quero que pegue o primeiro caminho, a primeira proposta, a primeira resposta. Não! Que não pegue nenhuma resposta. Que vá e que se perca e que ande no meio de tudo sem tocar nada.
Quero que se perca e se ache e que se encontre e que colecione possibilidades e que volte sem regras, sem visões cansadas, sem imãs de nada. Quero que vá. Quero que vá e que na volta, volte sem muitos desejos, sem muitos anseios. E que volte com a certeza que é pequena e que não a mal em ser assim. E que tudo que é muito escorre pelos dedos. E que encontre em si a força dada de graça.
E que veja tudo andando bem por aqui, mesmo sem seus olhos vigiando tudo, e que não é ela que gira o mundo, apesar da bondade do gesto. E que antes de voltar, perceba alguém que estende os braços e que olha todo mundo, enquanto ela tira férias de si. Para mim.
Por Natália Oliveira