quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

Nu inteIrior

É me carregando e me empurrando às vezes...
Tenho me pesado ultimamente. Não as gorduras, mas as bagunças internas que tenho para arrumar. Faz muito tempo que não mexo nelas, o excesso de coisas externas me ausentaram desse quarto de existência, aliás já deve beirar um sexto, sétimo. Não que eu tenha deixado de visitá-lo, eu até chegava a adentrá-lo, mas no cansaço jogava tudo para o lado e me aconchegava no descanso da beirada.
Esses dias, porém, me deram um ultimato: ou aparecia ou a leveza e o amadurecimento iriam embora. Sem saída, parei na frente do monte que me impedia de continuar sem pesos e aos poucos avancei. Abri caixas e enxerguei falhas passadas em cima de antigos palavrões. Portas quase abertas, esforços incompletos, limites não ultrapassados, quases. Abri as pastas e derrubei todo material no chão. Incertezas, dúvidas, dívidas, medos caíram aos meus pés.
Encontrei palavras desfeitas, contratos, desculpas. Olhei cada detalhe de tudo que pudia, frente e verso, cima, baixo. Achei alguns problemas resolvidos, mas remoídos na falta de outros assuntos. Enchi as mãos e rasguei todos. Os picados sumiram, deixando um gosto de riso e um degrau. O amadurecimento prometido acontecia. Continuei na ordem da desordem cada vez mais leve.
De repetente tropecei em uma vitória intacta. Soprei o pó que a cobria e lembrei do dia que a conquistei. Sempre a quis, mas não comemorei porque estava ocupada demais pensando nas coisas que o meu empenho máximo não tinha conseguido fazer. Dessa vez a abracei, pulei com ela e ri alto. Dancei sozinha. Ou melhor, com ela. Na coreografia inventada, gritamos alegrias, mandando embora todos os dedos apontados, constrangidos eles foram e não voltaram mais.
As latas de lixo já estavam cheias e a desordem bem menor, quando me deparei com sacos pretos. Avancei sobre eles e vi que estavam tomados por coisas que fizeram meu coração doer. Por impulso, arranquei tudo lá de dentro e com raiva pisoteei, não quebrou. Trouxe para perto do peito e tentei partir em vários pedaços, mas quanto mais colocava força, mais resistente e áspero ficava. Minhas mãos doíam e o sangue pulsava. Aquilo tudo não me permitia descarte. Nem sinal de gosto de riso e nem degrau.
Lágrimas rolaram. Sentei cansada, fechei os olhos, respirei fundo. No silêncio profundo os degraus me convidaran, obedeci. De cima percebi que os sacos eram menores que pareciam e o inquebrável não passava de proteção. Era preciso valer a pena ter sentido a dor, se a eliminasse antes do fim, se estilhaçaria e ficaria incolável, ganharia, então, o nome de fracasso . Não podia interromper o curso dos desesperos, das lacunas e dos excessos somados, eles eram necessários, precisavam ser vividos intensamente até perderem a cor.
Então o descarte chegaria junto com o gosto de riso e o novo degrau no momento certo. Com eles eu alargaria os lábios e cresceria mais um pouco, as coisas mudariam de tamanho, de temor, amadureceria. Enquanto isso não acontecia, era preciso respeito ao curso da vida.
É me entendendo e amando outras...
Por Natália Oliveira

6 comentários:

Analina Arouche disse...

É sempre complicado fazer esse tipo de descarte, tem coisas que não se vão, por mais que a gente tente. É um luta eterna com os nossos "insetos interiores".

Beijos!

Emerson Viana disse...

Ahh, mlk... Muito legal o texto! A parte "De repetente tropecei em uma vitória intacta. Soprei o pó que a cobria e lembrei do dia que a conquistei. Sempre a quis, mas não comemorei porque estava ocupada demais pensando nas coisas que o meu empenho máximo não tinha conseguido fazer." me lembrou o TCC daqui a alguns anos. Não podemos deixar de comemorar muito agora (e, claro, depois também...rs). Uma coisa não impede a outra....haha

Pensamento aqui é Documento disse...

Os insetos interiores nos picam, coçam, mas vivem pouco. É importante que aproveitemos sua estadia em nós, pq. eles nos chamam a atenção para dentro da gente, acho.

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Cris - do Todo Mundo Odeia o Cris -diria TCC "hoje, amanhã e sempre". hauauhauh. Uma não impede a outra, exato. Gostei da sua vida, muito!

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Beijos, queridos

Gleyce Miranda disse...

"Até cortar os próprios defeitos pode ser perigoso. Nunca se sabe qual é o defeito que sustenta nosso edifício inteiro" (Clarice Lispector)

É, alguns sentimentos, atitudes, ações, tendem a permanecer por mais que tentamos abandoná-los, e ali, de alguma forma, é melhor mantê-los do que jogar fora. O que pode ser descartado, também pode ser de grande valia!

Faz tempo que não passava por aqui... amei o novo post! Você sempre surpreendendo em cada um!

Pensamento aqui é Documento disse...

Luezas,

adoro essa frase de Clarice.

Assim como você, acho que o descarte pode ser de grande valia. Fonte para águas novas, vazios para novos preenchimentos.

Tê-la por aqui é sempre uma grande felicidade, sempre.

Um beiiijo

Daniel Savio disse...

Muita vezes acumulamos tanta coisa dentro do coração, tanto que impede que vivam coisas que precisamos no nosso coração...

Fique com Deus, menina Natália Oliveira.
Um abraço.