Ela arrumou o travesseiro dobrado embaixo da cabeça e olhou para a janela que, naquele momento, era metade cortina, metade fim de tarde. O sol aparecia tímido e frio atrás do prédio da rua vizinha e o céu azul se enrolava nas nuvens brancas em uma cumplicidade bonita. Sem desviar o olhar, puxou os cobertores para os ombros e sorriu para o que via.
Nunca foi de elogiar dias de inverno, mas sentia que, de uma forma coletiva, a criação se empenhava em experimentar o melhor que sabia, por que ela a contemplava. Como o ator que depois de tantos convites fracassados de repente vê a menina a ser conquistada na plateia sorrindo e por isso experimenta tudo que pode em um gesto só.
Feliz por ter um palco em sua janela, mexeu os pés vestidos de pantufas e riu para o silêncio tão falante daquilo que vivia. Virou o rosto, deixando os cabelos recém escovados escorregarem, e fechou os olhos para que as bailarinas, finalmente, deixassem a timidez e tirassem sua alma para dançar
Em um impulso de quem quer ficar, levantou e olhou de perto tudo aquilo de novo, antes que a noite brilhante chegasse com a lua no colo. E como quem está feliz verdadeiramente seguiu para a cozinha, alcançou o pote de torradas em cima da geladeira, lambuzou de manteiga meia dúzia de pedaços de pão torrado e por fim misturou preto e branco em uma xícara de porcelana que estampava o Cristo redentor.
Agarrou tudo, respirou fundo, sentou com as pernas de índio na cadeira e com um gole de felicidade genuína brindou a apresentação das bailarinas.
Por Natália Oliveira
6 comentários:
Cara Natália! Adoro balés. Clássicos, sobretudo.
Beijos, minha amiga.
Senti, invariavelmente, a falta do bailar de suas letras...
Muito bom!!!
=D
Abraços!
Que texto mais gostoso de ler Nati! Lindo! Parabéns!
"...Em uma tarde de domingo, sentar no chão, ao pé da cama. Sem nenhum assunto aparente, só observar. Pintando as unhas ao mesmo tempo que vira a limonada, suja o canto da boca..."
Essa é a lembrança mais linda que tenho de você e da nossa infância.
Queria voltar no tempo pra ver onde as bailarinas estavam enquanto eu eternizava o momento.
Perfeita! A sua capacidade de nos levar a viajar com seus pés é incrível... obrigada pelo presente!
Alvaro querido, balés são um encanto, né? Também adoro. Saudadocê.
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Rê!
Eu também sinto falta do despejar das palavras, mas acabo por me contentar com os mistérios do bailar.
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Obrigada, Ná!! =)
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Quando busco pelos valores reais da vida, as bailarinas me lembram daquele nosso encontro, de um simples e de um profundo inexplicável.
Amo vc e é pra sempre.
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Minha bonita.
Viajamos juntas sempre, ora com seus pés, ora com os meus.
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Beijos, queridos
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